As Filhas do Mar
As Filhas do Mar
Por Bruno Ricardo
Prólogo: O Chamado das Águas
Na pequena vila de Caminhos de Sal, situada à beira de um vasto e profundo oceano, os pescadores se levantavam ao amanhecer, suas redes sempre lançadas ao mar em busca de sustento. Porém, para Lia, uma jovem de cabelos ondulados como as marés e olhos que refletiam o azul do céu, a vida na vila era apenas um eco distante do que seus sonhos lhe sussurravam nas noites em que as estrelas brilhavam mais intensamente.
Desde pequena, Lia sentia uma conexão inexplicável com o mar. Quando os outros crianças corriam e brincavam na areia, ela se afastava, mergulhando nas águas profundas, ouvindo as canções suaves que pareciam emergir das profundezas. Mas nunca ousou falar sobre isso. As histórias sobre sereias e suas linhagens eram apenas lendas, diziam os mais velhos, e era melhor deixá-las na sombra das tradições que governavam a vila.
Parte I: O Encontro
Em um verão ensolarado, Lia conheceu Amara, uma nova residente da vila, que tinha um sorriso que iluminava até os dias mais nublados. Amara era destemida e curiosa, e logo se tornaram inseparáveis, explorando as falésias e as enseadas escondidas. Contudo, o que Lia sentia por Amara ia além da amizade; era uma conexão profunda, uma sintonia que reverberava em seu coração como as ondas do mar.
Certa noite, durante um festival à beira-mar, enquanto todos dançavam e celebravam, Lia sentiu a necessidade de se afastar. Caminhou até a água, onde as ondas acariciavam seus pés, e começou a cantar uma canção que sempre a acompanhava, uma melodia que ela não sabia que existia dentro dela até aquele momento.
Quando a canção ecoou na brisa noturna, Amara se aproximou, ouvindo a voz de Lia. Fascinada, ela ficou paralisada, encantada com a beleza da melodia. "Essa canção é maravilhosa! De onde você a tirou?", perguntou Amara, seus olhos brilhando com admiração.
Lia hesitou, sabendo que não poderia compartilhar o que realmente sentia, mas em um momento de coragem, respondeu: "Eu não sei. Acho que sempre esteve comigo. O mar a ensina."
Parte II: A Descoberta
Nos dias seguintes, Lia sentiu que algo estava mudando dentro dela. As águas chamavam mais forte, e a canção que havia cantado parecia ecoar em sua alma. Ao mergulhar nas águas, ela teve visões — fragmentos de memórias de ancestrais que dançavam nas ondas, sereias que protegiam os segredos do oceano. Ela estava destinada a ser uma delas.
Conforme Lia explorava essa nova descoberta, sua conexão com Amara se aprofundava. As duas garotas passavam horas conversando sobre sonhos e desejos, e Lia sabia que Amara era a única que poderia compreender a verdadeira essência de seu ser. Mas as tradições da vila eram opressivas. Lia não apenas enfrentava a luta interna de sua identidade, mas também o medo do que a vila diria se soubessem que ela era uma sereia.
Certa noite, quando as estrelas brilhavam intensamente, Lia decidiu revelar seu segredo a Amara. Elas se encontraram em uma enseada isolada, e Lia, com o coração acelerado, mergulhou no mar e emergiu como a sereia que realmente era, com escamas que refletiam a luz da lua.
Amara ficou sem palavras, mas em vez de medo, viu apenas beleza e força. "Você é incrível, Lia! Sempre soube que havia algo especial em você." O amor entre elas cresceu, mas as tradições e expectativas da vila estavam à espreita, esperando para separá-las.
Parte III: O Conflito de Tradições
As autoridades da vila logo notaram o comportamento diferente de Lia e começaram a sussurrar. Um velho pescador, Mestre Agustin, era particularmente cético e acreditava que a presença de Lia e sua conexão com o mar estavam ligadas a uma antiga maldição que ameaçava o vilarejo. Ele convocou uma reunião na praça da vila, onde expôs suas teorias sobre sereias que seduzem os homens e trazem a ruína.
A tensão cresceu, e Lia sabia que precisava fazer algo para defender seu amor por Amara e sua identidade. Juntas, elas decidiram que o único jeito de quebrar a maldição e se libertar das tradições era enfrentá-las.
As garotas organizaram um festival diferente, onde cantariam a canção ancestral de Lia, unindo a população em um ato de celebração e aceitação. Com a coragem de ambas, elas conseguiram reunir amigos e simpatizantes, mas o medo de Mestre Agustin e dos mais velhos ainda pairava sobre o vilarejo.
Parte IV: A Canção da Libertação
Na noite do festival, o mar estava calmo e a lua cheia brilhava intensamente. Lia e Amara estavam ansiosas, mas decididas. Com o apoio dos amigos, elas se posicionaram na beira da água. Lia começou a cantar, sua voz ecoando como um chamado ao mar.
Quando Amara se juntou a ela, a melodia parecia tecer um feitiço, e as águas começaram a brilhar. Os vilarejos, inicialmente hesitantes, começaram a se aproximar, atraídos pela música. A canção de Lia não era apenas uma celebração; era um convite à compreensão, à empatia, e ao amor.
Mestre Agustin, percebendo a força do que estava acontecendo, avançou furioso, mas a maré começou a subir, e Lia, com uma bravura que não sabia que tinha, olhou para ele e disse: "A verdadeira maldição é o medo que nos separa. Estamos aqui para celebrar a vida e a liberdade, não para se esconder nas sombras."
Com a força do amor e da música, a canção começou a ressoar em todos os presentes, fazendo com que os medos se dissipassem como a névoa ao amanhecer. As tradições começaram a quebrar, e os vilarejos perceberam que o amor verdadeiro não conhece limites.
Parte V: O Novo Amanhã
Ao amanhecer, o vilarejo estava mudado. Lia e Amara eram agora símbolos de uma nova era, onde o amor e a aceitação prevaleciam sobre o medo e o preconceito. A canção que havia libertado as Filhas do Mar também tinha despertado um novo sentido de comunidade entre os moradores.
Mestre Agustin, embora ainda relutante, começou a ouvir as histórias dos mais jovens e a entender que o amor de Lia e Amara era um reflexo da força do mar — livre e incontrolável. Com o tempo, ele se tornou um defensor da nova era, reconhecendo que as tradições poderiam evoluir.
Lia e Amara continuaram a explorar suas identidades, navegando nas águas do amor e da aceitação. Elas se tornaram líderes na vila, ajudando a unir as pessoas e a ensinar sobre as lendas das sereias e a importância de respeitar todas as formas de amor.
Epílogo: As Filhas do Mar
Anos se passaram, e o vilarejo prosperou. Lia e Amara eram agora mães de uma linda filha, que herdara o amor pelas águas e a música. Elas costumavam levá-la à praia, onde, em noites claras, cantavam a canção ancestral, que agora pertencia a todos, e não apenas às Filhas do Mar.
O oceano sussurrava histórias de amor, coragem e aceitação, e Lia e Amara sabiam que haviam quebrado não apenas uma maldição, mas também a barreira entre os corações das pessoas. O amor é uma força tão poderosa quanto o próprio mar, e, como as ondas, sempre encontrará um caminho para fluir livre.
Fim
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